Tenho um amigo, o Billy, que além de veterinário que vive atrás de uma vacina contra os efeitos da picada de escorpião, é um artista. Foi bailarino numa das mais importantes Companhias de Balé de Belo Horizonte. Craque em informática.
Ele mora num dos bairros mais arborizados de Uberlândia, perto do Shopping que foi do Airton Garcia. Lá, o canto dos pássaros, a batida do bico do pica pau no galho da árvore, é uma constante. É assim até hoje.
Geralmente aos sábados eu ia a cada dele tomar uma cervejinha e rever outros amigos da roda. Certa vez, descobri que o Billy tinha a coleção completa da revista Isto É.
Quando percebeu meu interesse, já foi logo avisando que nenhum exemplar sairia de lá. Fiquei feliz em poder folhear algumas raridades da nossa história, ali mesmo no fundo do quintal da casa dele, em volta da mesa.
Nessas ocasiões sempre tem algo que chama a atenção. E a gente não esquece. Numa edição de 1978 tinha uma reportagem abordando a confluência de interesses de jovens dos mais diversos países, inclusive os comunistas.
Mas como? Me perguntei. Como pode o jovem brasileiro, ter as mesmas aspirações de um menino africano, americano, suéco, alemão, coreano... enfim. A gente ainda não estava na Syber Era. Nem Fax existia nessa época.
Mas as aspirações, as vontades, a esperança de um mundo melhor estavam lá, contadas naquelas páginas já amareladas pelo tempo.
Acho que ninguém melhor que Jung para definir esse arquétipo, chamado inconsciente coletivo – Jung chamou a atenção para o fato de que o inconsciente coletivo retém informações arquetípicas e impessoais, e seus conteúdos podem se manifestar nos indivíduos da mesma forma que também migraram dos indivíduos ao longo do processo de desenvolvimento da vida.
Neste quesito, a gente passa a entender o que leva dois grupos a desenvolver, simultaneamente, uma nova tecnologia, apesar de um nem saber da existência do outro.
Mas, já naquela época a garotada dizia-se esperançosa quando ao futuro, à possibilidade de estudos, saúde, bons salários e claro, ficar rico rapidamente. A segurança nem apareceu com muita ênfase.
Hoje, lamentavelmente, as mortes precoces interrompem sonhos de famílias inteiras nesse Brasil descabido.
Somos o 6º país em mortes de jovens no mundo. Morrem atirados pela Polícia, vítimas de balas “perdidas”, guerra entre traficantes e por acidentes de carro e moto. O dado é do Unicef. Em números absolutos, o Brasil teve, em 2012, mais de 11 mil homicídios de pessoas entre 0 e 19 anos de idade. O Unicef pesquisou 190 países. À frente do Brasil em assassinatos de jovens estão El Salvador (27/100 mil), Guatemala (22), Venezuela (20), Haiti (19) e Lesoto (18).
Tudo isso tem uma causa - a desigualdade social, ao acesso facilitado às armas de fogo, ao alto consumo de drogas e ao crescimento da população jovem. E olha que horror. Um em cada cinco assassinados no mundo tem menos de 20 anos, uma em cada 10 meninas em todo o mundo já sofreu algum tipo de abuso sexual forçado.
Faz muito tempo que não falo com o Billy. O bairro onde ele mora, é tipo americano. Quando eu ia lá, não tinha em cerca, muro ou divisa. O espaço na frente das habitações era comum. Hoje as casas estão todas muradas, com câmeras e vigilantes nas ruas.
O Billy, sempre ligado a causas humanitárias, com certeza, está sofrendo por viver trancafiado, ao ver o sonho da juventude brasileira, sendo manchado com tanto sangue.
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